quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Cremada

*Alertamos que o conteúdo deste post traz uma carga densa de papo de mulé. Se seu estômago for sensível, leia outro post.

Quando a gente completa dezoito anos, se acha importante por finalmente ter idade suficiente para dirigir, beber, ser preso, entrar em shows, baladas, motéis, bingos e afins.

Quando uma mulher completa 25 anos e se acha importante por finalmente ter idade suficiente para começar a usar creme anti-sinais é, na verdade, sinal de que algo está errado: é a prova cabal de que ela se tornou uma adicta dos cremes em geral (pois convenhamos, não tem nada de excitante começar a usar creme anti-rugas).

Sempre fui uma usuária comedida de cremes. Na verdade, há relativamente pouco tempo me tornei adepta do hidratante básico, pois odiava melação. Tudo mudou quando descobri os cremes de absorção rápida. Comecei light: um hidratante corporal e outro facial após o banho.

É sempre assim que começa. Um hidratantezinho inocente aqui, um creminho antes de dormir ali... de repente, quando você percebe já está consumindo todo tipo de creme, até dos mais hardcore.

É uma beleza aquela fase dos 17 aos 22 anos. A gente está sempre linda, durinha, sequinha e sem celulite. Mais tarde você descobre que mesmo sendo magra, pode ser flácida, ter celulite e aquele pânceps turbinado cobrindo o cós da calça. Sua pele já não tem a mesma vitalidade de poucos anos atrás e começa a dar indícios de que o processo de decadência já começou. É aí a gente começa a perceber que entramos em fase de manutenção eterna.

Agora é só ladeira abaixo meeesmo, então freios são mais que necessários. Tem que se ligar pra não abarangar de vez. Mil cremes, refrigerantes zero e barrinhas de cereal, dietinhas de uma semana e a promessa de começar a drenagem linfática no mês que vem e a academia na segunda-feira.

Voltando ao meu desabafo como nova adicta dos cremes, estou chutando o balde e comprando litros de cremes de todos os tipos. Ontem mesmo comprei um hidratante para o corpo, um hidratante para as mãos, máscara facial purificadora e um creme anti-celulite para se juntar à minha coleção de dois hidratantes faciais (um para o dia, outro para a noite), creme esfoliante, protetor solar corporal e um facial. Confesso que já estou de olho em um creme firmador e redutor de medidas, um atenuante de olheiras e o tal do anti-sinais. Queria muito que essa compulsão por cremes fosse uma coisa normal. Mas algo me diz que não é. É?

Agora é pra toda a vida. Na minha urna (porque prefiro a cremação) vai estar gravado "Ana Luiza Pimentel viveu e morreu cremada".

P.S.: Pensando bem, cancela a urna! Podem mandar fazer um creme esfoliante com as minhas cinzas e colocar num potinho bonito. o.O

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Planeta Terra chamando!

I love rock'n'roll, porque eu vou ver o Jesus and Mary Chain (e o Breeders de novo, meldels!) no próximo sábado, no Festival Planeta Terra. Além dos favoritos da noite, só bandas legais no line hyp...line up: Kaiser Chiefs, Bloc Party, Spoon...

De quebra vou alimentar meu bichinho adolescente e nostálgico interior vendo Offspring e cantando linda e maravilhosa todas as músicas que eu adorava quando tinha 14 anos, antes de virar chata e ter a infeliz idéia de trocar o meu Smash rejeitado por algum bootleg indie no sebo. Só faltou o Calvin Harris para deixar meu lado groove-let's-dance feliz. Pena que não rolou. Mas tuuuudddo beeeem, porque eu vou ver o Breeders e o Jesus and Mary Chain ao lado do meu amor e dos meus amigos. Só por isso a noite já vai valer a pena. Um brinde aos grandes festivais!

Já estou tentando entrar no clima. Sim, é uma música feliz e saltitante do Jesus and Mary Chain (!) e por isso, se eles tocarem essa música no show, vai ser o tema oficial do festival para mim.


I had trouble but I found my star
I found myself an electric guitar
Well I was some kind of messed up kid
Now look what you did
Look what you did
You made me, yeah
You make me, yeah

Well I'm not preaching or making a case
I'm not trying to make the world a better place
Well I ain't evil, but I ain't good
I did what I could
I did what I could
To save me, yeah
To save me, yeah

I love rock'n'roll
I love what I'm do-ooing
I need rock'n'roll
Gets me where I'm going

Don't need money if you've got soul
And it don't matter if you're young or you're old
Well I don't worry what the people say
They say what they say
I go my own way
But that's me, yeah
It suits me, yeah

I love rock'n'roll
I love what I'm do-ooing
I love rock'n'roll
Gets me where I'm going
Don't need anyone
Don't need anything
Don't need anybody
I need rock'n'roll

d··b - Ouça!
Jesus and Mary Chain - "I love rock'n'roll"

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Para minha irmã mais nova

Eu lembro nítidamente do dia em que você nasceu. No dia 14 de outubro de 1988 eu tinha quatro anos, trezentos e dezessete dias e algumas horas, o que na época, para mim parecia muito. Mamãe, papai e vovó me acordaram cedo para que fôssemos logo para o hospital, pois sua cesárea estava marcada para as sete da manhã.

E lá fomos nós no Chevette cinza escuro metálico. Eu dormi no caminho. Chegamos lá, mamãe entrou com papai pela porta de atendimento e eu fiquei na sala de espera com a vó. Coitada da vó. Mal sabia ela do que a esperava. Acho que nunca vi aquela doce mulher tão brava. Mas não foi à toa, eu coloquei toda a paciência dela à prova, infernizei a vida dela e do resto dos funcionários do hospital.

Eu estava acostumadíssima a fazer partos. Era um processo extremamente rápido, prático, limpo e eficiente. A mãe e o bebê chegavam à mesa de cirurgia, era feita uma incisão na barriga, o bebê saía por baixo da camiseta, o bebê chorava e pronto! Mamãe e bebê passavam bem e iam para casa. Mas no dia em que você nasceu não foi bem assim.

Cheguei bem disposta, sabendo que talvez esse processo levasse algum tempo, mas um tempo suportável. Até trouxe um “kit-entretenimento” munido de revistinhas e uma caixa de Bis. Em uma hora ou duas eu não seria mais filha única e teria uma irmã para brincar comigo. Só que o tempo foi passando lentamente e toda aquela disposição começou a se transformar em impaciência e toda aquela impaciência se transformou em chateação alheia. O tempo é relativo e para uma criança pequena uma hora dura três. Estava demorando demais! Partos não deveriam ser demorados! Achei muito estranho. Fiquei o tempo inteiro questionando a competência da equipe daquele hospital. Onde já se viu demorar tanto pra se tirar um bebê de dentro da barriga da mãe! Uma coisa tão simples!

Distrair uma criança com um pouco de TV poderia ser uma boa solução. Mas eu não era uma criança qualquer. Eu era seletiva, chata e assistia a programas educativos da TV Cultura. Estava passando o Xou da Xuxa. Eu não gostava da Xuxa e nem dos desenhos chatos que passavam no programa. Comecei a protestar. No programa da Mara, embora achasse ela uma chata de galocha, ainda passava o desenho do Pica-Pau ou do Tom & Jerry. Protestei mais. Vovó pedia que eu ficasse quietinha, pois estávamos em um hospital. Parei de protestar, mas me senti injustiçada demais para ficar calada e fui educadamente pedir no balcão que trocassem de canal. Pedido recusado. Só pegava Globo naquela TV. Eles não sabiam o que estavam fazendo. Não se deixa uma criança hiperativa, chata e seletiva, de quatros anos, trezentos e dezessete dias com algumas horas sem desenho animado decente.

Saquei uma revistinha em quadrinhos do Garfield. Eu era uma leitora precoce de apenas quatro anos, trezentos e dezessete dias e algumas horas a mais do que quando cheguei no hospital naquele dia. Estava aborrecida. Aposto que vovó e as outras pessoas do recinto desejaram que eu não soubesse ler. Comecei a ler minha tirinha favorita naquele momento, com a qual eu me identificava totalmente durante aquela longa espera. Era uma tirinha de três quadrinhos com o gato laranja e gordo na mesma posição resmugando num balãozinho de pensamento como um mantra rabugento: “tédio, tédio, tédio, tédio, tédio, tédio, tédio...”. A palavra tédio se repetia e se espalhava como praga e engordava o balãozinho a cada quadrinho. Algum tempo antes desse episódio eu perguntei para meu pai o que queria dizer tédio. Naquele dia eu vivi o tédio intensamente pela primeira vez depois de descobrir o conceito. Pois aquela menina hiperativa de quatro anos, trezentos e dezessete dias e mais algumas e lentas horas na bagagem tomou o mantra do tédio para si. Bradava em alto e bom som: “tédio, tédio, tédio, tédio, tédio, tédio, tédioooo!!!”. Continuei protestando com meu mantra até tomar um puxão de orelha. Foi então que resolvi me mexer.

Fui até à recepção, fiquei na ponta dos pés até alcançar a beirada do balcão e me pendurei para pedir informações sobre o parto:

- “Moça, a minha irmã já nasceu? Eu nasci às nove horas da manhã e já são quase onze!”

Minha irmã já havia nascido. Mas não era só nascer, havia todo um longo e complexo processo por trás do simples ato de nascer que eu desconhecia.

Fiquei um pouco mais consolada. Em alguns minutos minha mãe e meu pai sairiam pela porta carregando minha irmã, voltaríamos para casa e todas aquelas horas agonizantes teriam ficado para trás. Vovó abriu a caixa de Bis e eu fiquei tranqüila.

Estava quase caindo no sono no colo da minha avó quando uma das moças da recepção nos chamou discretamente e uma enfermeira nos levou até uma salinha. Eu não entendi bem o que estava acontecendo. Recebi a instrução de ficar quieta, de forma que ninguém pudesse perceber minha presença, pois crianças não eram permitidas no recinto, especialmente crianças falantes de quatro anos, trezentos e dezessete dias e várias e cansativas horas. Fiquei calada.
De repente a porta se abriu. Era meu pai e uma enfermeira com um carrinho de lona branca. Dentro do carrinho de lona estava você. Pequenininha, enrolada em uma manta, com os olhinhos entreabertos e carinha de cansada, sem prestar muita atenção no que estava acontecendo.

- “Ana Luiza, essa é a sua irmãzinha”.

Naquele dia, na hora do almoço, vovó ficou com a mãe e eu e o pai saímos juntos. Ele tinha ficado sabendo da minha impaciência na sala de espera e me comprou um pega-peixe para eu me distrair e parar de azucrinar a vida da vovó e das atendentes do hospital. Mas eu já estava tranqüila, minha irmã já tinha nascido e agora eu era a irmã mais velha, o que para mim era uma grande responsabilidade. Paramos em uma loja de roupas para bebês para comprar sua primeira roupinha oficial. Passamos um tempão vendo roupinhas de nenê. Ficamos em dúvida sobre qual cor seria a mais adequada. Eu era contra cor-de-rosa. Achava chata essa imposição de rosa para as meninas e azul para os meninos. Escolhi um macacão amarelo e branco.

Isso foi há vinte anos...

Feliz aniversário, Raquelzinha!

Da sua irmã, Ana Luiza aos vinte e quatro anos, trezentos e dezessete dias e algumas horas que passaram rápido demais.